*por Jacqueline Peixoto
Olá, Andrea,Marcio, Possi e Sâmia. Eis um pouco do que foi ” os tempos” para mim.
Resignação ……
As mudanças atuais na nossa sociedade faz-nos repensar muitos valores, valores estes que nos remetem a sensações e tempos diferentes. Acredito que pensar em tempo hoje é associá-lo à velocidade e a variação dela em nosso cotidiano.
Estamos em constante diálogo com um tempo que muitas vezes nos é imposto. E onde a idéia de liberdade a meu ver é cada vez mais utópica. Desta forma, na aceleração do tempo real das coisas que fazemos desaceleramos um outro tempo que é tão peculiar à nossa sobrevivência artística: o tempo da percepção, da sensação, da inclusão e da relação com o outro…
Ressalto isto porquê foi assim que me senti(suspensa em um outro tempo) ao assistir ao espetáculo ” Os tempos” da Cia Arte Andanças sob a direção da coreógrafa Andrea Bardawil e dos intérpretes-criadores: Marcio Medeiros, Possidônio Montenegro e Sâmia Bittencourt no dia 14 de julho de 2008(ainda em um ensaio).
O mesmo em sua forma e composição fez-me rever um outro tempo e aguçou em mim possibilidades outras de fazer, pensar e porquê não dizer, dividir a dança.
A sintonia e generosidade dos três intérpretes – criadores nos convida a dançar o espetáculo inteiro. Aliás, também somos co-participantes/bailarinos do mesmo, desde o tirar os sapatos para assistí-lo em uma sala extremamente agradável e aconchegante, a olhar nos olhos dos bailarinos, estabelecendo uma troca energética, além de sentir vontade de embolar-se com os mesmos na cena final.
Ressalto também a qualidade energética com que a coreógrafa Andrea Bardawil incita e nos mostra através de seus bailarinos/intérpretes. Há uma variação de energia muito bem dosada, suscinta, capaz de conduzir o espectador a uma viagem por lindas imagens. Aqui recordo a expressão ”corpo-em-vida” de Eugênio Barba. Os três corpos que dançam este trabalho parecem às vezes nos contar histórias tão particulares que nos dizem muito com suas movimentações…Histórias são contadas sem uma palavra ser dita, porquê o corpo já se dá conta de nos falar muito… Os bailarinos não dançam só com o esqueleto,eles dançam com seus afetos e isto conseqüentemente nos afeta enquanto público.
Os objetos cênicos da obra, lençóis e travesseiros além da trilha sonora que ora aproxima e ora nos afasta, tornam-se uma ponte a nos propiciar um encontro significativo com o espetáculo. Pois, nos sentimos tão á vontade que as horas passam e não percebemos o tempo final do espetáculo, já que estamos em um tempo dilatado: o tempo, da delicateza, da sutileza, do encontro,do afeto,da verdade, da sinceridade, da generosidade,enfim.
É na simplicidade que Andrea e seus dançarinos nos falam profundamente da complexidade que é viver e de estarmos inseridos nesta dialética do mundo contemporâneo. O tempo não dito. Em que o tempo delicado é delicado tempo….
Acredito que o espetáculo faz-nos pensar na prática deste outro tempo enquanto fomentadores da dança que somos e instiga-nos a sermos artistas mais generosos com a dança que pretendemos partilhar.